sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

"Ruptura no PSD"

Golpe de teatro. É assim que um deputado social-democrata descreve a jogada de antecipação de Paulo Rangel. Antes do anúncio de José Pedro Aguiar-Branco marcado para sexta-feira, o eurodeputado volta para Lisboa e avança com a candidatura à liderança do PSD. Uma ruptura que não surpreende completamente o advogado que lidera a bancada parlamentar laranja, mas que o deixou muito zangado com o antigo amigo.

À zanga entre amigos corresponde alguma satisfação da candidatura de Pedro Passos Coelho. Como dizia ontem um divertido Miguel Relvas, apoiante de primeira hora de Passos, "não há fome que não dê fartura. Vamos ter mais dois candidatos" - e logo dois políticos que disputam o mesmo eleitorado no interior do partido.

A relação entre Aguiar-Branco e Rangel é antiga mas a desconfiança - ou o jogo de sombras na corrida à liderança - estava em crescendo desde Dezembro, altura em que o eurodeputado terá garantido ao amigo que não se candidataria, dizendo que o apoiava. Os ânimos estavam por isso exaltados ontem entre os apoiantes de Aguiar-Branco, que ainda esta semana voltou a informar Paulo Rangel de que iria avançar sexta-feira, como previsto, depois de arrumada a questão do orçamento do Estado. Em resposta, recebeu apenas o silêncio.

O silêncio foi quebrado ontem, com o anúncio bombástico da candidatura do eurodeputado. Segundo fontes próximas da candidatura de Rangel, a ainda líder do PSD, Manuela Ferreira Leite, só ontem foi informada da intenção. Paulo Mota Pinto, vice-presidente do partido, declarou o apoio. Outra vice-presidente, Sofia Galvão, está entre os apoiantes mais entusiastas - foi aliás a única dirigente que esteve ao lado de Rangel na apresentação da candidatura. A ideia é dizer que avança só, sem negociar com ninguém, distritais ou "elites", falando directamente aos militantes sociais-democratas. Sem intermediários.

José Pedro Aguiar-Branco já tinha marcado uma reunião do grupo parlamentar, que decorreria logo a seguir à votação do orçamento de Estado, na sexta-feira. Objectivo declarado: anunciar à bancada que chefia que seria, a partir daí, candidato à liderança do PSD.

Quando a notícia da antecipação de Paulo Rangel, o também ex-líder parlamentar, foi conhecida entre os apoiantes de Aguiar Branco, foi o choque e a fúria: choviam as acusações de "deslealdade" daquele que foi secretário de Estado do próprio Aguiar- Branco, quando este ocupou a pasta da Justiça no governo Santana Lopes. Afinal, Rangel não tinha avisado Aguiar-Branco, apesar das conversas que mantiveram nos últimos tempos.

Uma ultrapassagem que não é inédita na história política portuguesa: depois de Constâncio se demitir de líder do PS, António Guterres e Jorge Sampaio combinaram que nenhum dos dois avançaria sem avisar o outro primeiro. Mas Sampaio acabaria por candidatar-se, deixando Guterres surpreso e em fúria. Mas, ao contrário do que se passou em 1989, quando Guterres não chegou a apresentar a candidatura perante a antecipação de Sampaio, desta vez Aguiar-Branco decidiu ir à luta.

Manuela Ferreira Leite recusou comentar a candidatura de Paulo Rangel, mas ao que o i apurou, a líder identifica-se mais com o perfil de Rangel do que com o de Aguiar-Branco. De resto, a primeira declaração formal de apoio a Rangel veio de um dos vice-presidentes do PSD mais próximos de Ferreira Leite, Paulo Mota Pinto. Numa declaração escrita, Mota Pinto foi entusiástico no apoio a Rangel: "Esta é, a meu ver, a candidatura pela qual ansiavam os militantes do PSD e, em geral, os portugueses, para quem nesta hora o superior interesse nacional exige uma alternativa forte, credível, mobilizadora e vitoriosa ao desgoverno socialista. No que estiver ao meu alcance, ajudá-lo-ei a ganhar o PSD e, sobretudo, a ganhar Portugal para o futuro que merece".

"O risco das duas candidaturas da ala cavaquista-barrosista-ferreirista serem um factor de divisão de votos e facilitarem a eleição de Pedro Passos Coelho é evidente. É verdade que Rangel já recolheu ontem o apoio de Miguel Veiga - um histórico muito próximo do militante nº 1 do PSD, Pinto Balsemão - mas Alexandre Relvas, o presidente do Instituto Sá Carneiro, já tinha declarado apoiar a candidatura de Aguiar-Branco. Mas entre os "rangelistas", havia quem ainda contasse poder alterar a posição do ex-director de campanha de Cavaco Silva.

"O conselho nacional do PSD marcado para amanhã à noite vai decidir agora a data para o congresso extraordinário, defendido por Pedro Santana Lopes, que recolheu as 2500 assinaturas necessárias, e a marcação das directas. "O Congresso será marcado numa data anterior à das directas e queremos ter as coisas concluídas em Março", disse ao i o presidente da Mesa do Congresso, Rui Machete."

Por Ana Sá Lopes com Paulo Pinto Mascarenhas,
com Sónia Cerdeira, Patrícia Silva Alves e Adriano Nobre
Publicado no "i" em 11 de Fevereiro de 2010

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