sexta-feira, 1 de julho de 2011

Joaquim Benite "Canavilhas era uma terrorista. Viegas é uma pessoa culta"

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Depois do 25 de Abril o teatro melhorou?

Nuns aspectos sim, noutros não, porque se tornou demasiado panfletário o que afastava as pessoas em vez de reunir. Deu origem a muitos oportunismos, pessoas que nunca lutaram pela revolução aparecerem por lá. O habitual oportunismo português, a razão pela qual estamos como estamos. Sabe qual é o problema? Na minha opinião é porque não temos elites. Preparam-se estes Sócrates, sem preparação. Raramente tivemos grandes homens de Estado, tivemos o Marques de Pombal, o Afonso Costa, o Salazar, dentro do seu projecto de direita. Somos governados por gente ignorante, analfabeta. Não quer dizer que não haja pessoas competentes, não há é uma escola.

O que acha do Ministério da Cultura ter sido reduzido a uma secretária de estado?

Ser secretaria de estado ou ministério não faz diferença, porque a secretaria de estado do Santana Lopes tinha mais dinheiro que o ministério da Canavilhas. Há duas hipóteses para a atitude do Primeiro-Ministro. A secretaria de estado pode significar que é ele próprio que se vai interessar pela cultura. Ou então, não se interessa nada e criou-a para resolver os problemas do teatro nacional. Se for esperto investe na cultura que dá muita propaganda e que não está nos acordos da Troika. Qualquer primeiro-ministro que governe Portugal está preso pela Troika e não pode fazer nada em todas as áreas, excepto a cultura. É esperar para ver.

Gosta do secretário de estado da cultura, Francisco José Viegas?

Pelo menos é uma pessoa interessada e culta e a Canavilhas, para mim, era uma terrorista, o ministério da cultura do Sócrates é uma espécie de invasão dos Hunos.

Porquê?

Destruiu tudo o que estava feito, mudava de opiniões e nomeou uma pessoa absolutamente inclassificável, sem preparação para director geral das artes, o João Aidos. A ex-ministra é uma boa pianista, fez um bom trabalho na Orquestra Metropolitana, mas tornou-se frívola e deslumbrou-se com ministério. Depois resolveu cortar nos subsídios das principais companhias. A mim tirou-me 150 mil euros e não posso perdoar a quem me tira esse dinheiro.

Como é a cultura tem sido tratada?

Portugal é um país onde não se acarinha a cultura, não é um país culto. Não percebemos uma coisa essencial: para desenvolver o país temos de investir na educação. A educação nos últimos 30 anos caiu numa bagunçada. Durante estes 10 anos, com Durão Barroso e Sócrates, quais foram as únicas coisas que trouxeram desenvolvimento? A ciência, com o Mariano Gago, e o futebol. Temos 500 jogadores profissionais em grandes clubes, somos a segunda potência a exportar jogadores e esses jogadores dão dinheiro ao Estado, porque as transferências pagam grandes impostos. A origem das coisas é a formação, a escola do Sporting, do Benfica, que deu Cristianos Ronaldos, Figos, e na ciência, Mariano Gago criou condições de apoio aos jovens cientistas. Nas outras áreas não se actuou. Somos o único país em que o Ministério da Cultura e Educação não têm ligação. Não se preparam as gerações do futuro.

A cultura é subsidiodepentente?

É ridículo falar disso num Estado que é subsidiodependente. As pessoas que dizem isso, o Graça Moura e o Barreto, sempre viveram do dinheiro do estado, como investigadores nas universidades. Não faz sentido.

O teatro não pode estar dependente das leis do mercado?

Na teoria geral economia é lei da oferta e procura. Na cultura é o contrário, tem de se suscitar a procura para haver oferta.

Na sua carreira foi distinguido com muitos prémios, é comendador, tem o grau de Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras, do governo francês...

Francês, espanhol, agora já me habituei faço colecção. Tenho uma certa irreverência natural, não ligo muito a isso. São distinções compensadoras. Sou comendador e cavaleiro de alguns países, às vezes gozo que nunca mais me mandam o cavalo.

Sente que vai ficar na história?

Os encenadores nunca ficam na história. Só os escritores, como o Shakespeare. Sabe, acho que vale a pena viver para nos divertirmos. Lutar por coisas, para cumprir missões, não. O teatro é um sinal de civilização que está na origem da sociedade. Até nos animais. Quando chego a casa o meu cão faz uma dança que parece egípcia, pá. São rituais de representação. Mas o teatro não tem missão nenhuma. É uma coisa que as pessoas fazem porque gostam e as outras vêem porque lhes dá prazer. Uma vez estava em Sines e dizia-me uma vereadora: "Não tem umas peças que ensinem os miúdos a lavar os dentes". O teatro não tem anda a ver com isso, só se fizéssemos uma peça sobre revoltar-se contra o lavar dos dentes.

[ a notícia toda em:
http://www.ionline.pt/conteudo/133832-joaquim-benite-canavilhas-era-uma-terrorista-viegas-e-uma-pessoa-culta ]

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