quinta-feira, 31 de março de 2011

A "brincadeira" que fizeram a Souto Moura

A simplicidade do Homem parece corresponder à simplicidade da sua obra. Normalmente é assim, como diz a velha máxima francesa: "Le style c'est l'homme". O estilo é o homem. A reacção de Souto Moura, anteontem, aos jornais DN e JN, "telefonaram-me, e pensei que não passava de uma brincadeira", releva a personalidade de um personagem que, nestes dias de tanta angústia lusitana, leva Portugal às bocas do Mundo.

Não conheço pessoalmente Souto Moura. Exprime nas obras que conheço, Centro de Arte Contemporânea de Bragança, Ponte das Barcas (Porto), Estádio do Sporting de Braga, formas simples, falantes, cativantes. Não tenho capacidade para discernir a valia da sua obra. Simplesmente, gosto, atrai-me, impõe-se. E, sobretudo, sei que receber tal galardão, o prémio Pritzker, qual Nobel da Arquitectura, não é brincadeira nenhuma. Um outro monstro da arquitectura mundial, o português Siza Vieira, Pritzker (1992), teve esta apreciação sobre esta distinção atribuída a Souto Moura: "Era um prémio inevitável" (Público, 29.03.11).

Mas, este prémio conferido a Souto Moura pela Fundação Hyatt (EUA), tem outras leituras. Num país que atravessa neste período da sua história, provavelmente, o mais baixo nível de motivação, esta distinção atribuída a Souto Moura, à Arquitectura portuguesa e à Escola de Arquitectura do Porto, é um indicador das capacidades subsumidas num povo que tem talento e arte desperdiçadas a rodos pela repetida conduta de desaproveitamento, caldeada em hábitos de vida improvisada e fácil. Fujo de só responsabilizar os nossos políticos e governantes (não é que estes não tenham graves e grandes responsabilidades) pelas desgraças que nos vão batendo à porta. Se quisermos ser profundamente sérios, teremos de ser mais austeros e castigadores para os desleixos, desmazelos, e não estar sempre a empurrar para os outros culpas e responsabilidades que são nossas.

O triunfo de Souto Moura é um estímulo. Entre aqueles que, hoje, engrossam a dita "geração à rasca" muitos são jovens arquitectos. É um curso apetecível, mas difícil de lá chegar. Basta ver as médias altas para conseguir entrar numa faculdade e para depois arranjar trabalho. Em muitos outros campos da ciência e das actividades nos diferentes sectores profissionais, nas áreas da engenharia, da informática, da biologia, das ciências sociais há portugueses a vencerem mérito e consagração.

A vitória de Souto Moura não paga a dívida soberana. Mas sugestiona o desejo de recobrarmos forças para vencer as agências de "rating" e seus informadores albergados em solo nacional.

Paquete de Oliveira
http://www.jn.pt/Opiniao/

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