"(...)Só é pena que José Sócrates seja tão previsível e não tenha tido a ousadia de levar ao hemiciclo (da AR) um outro tema não menos importante e para o qual se exigem soluções urgentes e combate igualmente vigoroso: a corrupção. Curiosamente, uma outra instituição estrangeira, a Transparência Internacional, divulgou, também na semana passada, o Barómetro Global da Corrupção, de que Portugal não sai nada bem. Piorámos em vários aspetos, como no índice de transparência, mas o que impressiona é a perceção que os portugueses têm sobre a evolução do fenómeno. Face a 2007, 75% dos inquiridos no estudo acham que a luta contra o fenómeno é ineficaz e 83% pensam que a corrupção aumentou, nos últimos três anos. Partidos, Parlamento e setor privado são tidos como os mais corruptos, sendo que, basicamente, a maioria dos portugueses acredita que os principais corruptores se situam no sector privado e que os corrompidos fazem parte do sector público.
"Tem-se feito muito pouco para resolver este problema. O PS de Sócrates revelou-se, de resto, muito timorato na elaboração da última legislação aprovada, com as propostas mais avançadas e notoriamente mais eficazes de João Cravinho, defendidas por um restrito grupo da ala mais à esquerda, a serem derrotadas em toda a linha, depois de muitos contorcionismos e episódios pouco edificantes, na bancada socialista. Também o Presidente da República acabou de promulgar a nova Lei de Financiamento dos Partidos, um diploma muito pouco claro em aspetos cruciais como "a transparência e controlo" (palavras dele) dos dinheiros privados que entram nos cofres partidários. Cavaco Silva vetou, em junho de 2009, a anterior proposta, mas, sem se perceber porquê, deixou agora passar a nova versão, à qual prodigalizou numerosas críticas, em mensagem ao Parlamento. Ou seja, o Presidente subscreveu a lei, apesar de ele próprio considerar que se mantém o essencial dos problemas que, antes, justificaram o veto. Ao deixar passar esta lei, o PR defraudou todos os que, no terreno, se empenham na luta contra a corrupção. (...)
"Ora, o Governo, se tiver vontade política, pode alterar este estado de coisas. Legislação clara e transparente precisa-se... com carácter de urgência. E, quem sabe, talvez surjam resultados positivos para Sócrates exibir no Parlamento. Desta vez, em matéria de corrupção."
Áurea Sampaio, Visão 16.XII.2010
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