quinta-feira, 6 de maio de 2010

Encontrar o caminho

"Na última semana, os factos e as suas consequências tornaram-se inexoravelmente reais e forçaram as falsas barreiras com que o Governo tem envolvido a nossa precária realidade.

"Este pode ser o primeiro passo para encontrar o caminho, e recuperar o tempo que se perdeu na anterior legislatura, no período eleitoral dominado por um discurso socialista de negação, nos primeiros meses desta legislatura consumidos em inúteis inquéritos parlamentares, num debate político de episódios circunstanciais, na discussão de um Orçamento de duvidosos pressupostos e imprevisível execução e de um PEC cheio de incógnitas. (...)


"A governabilidade é essencial mas não basta. Sabemos que o que temos pela frente vai exigir mais do que entendimentos parlamentares e que é indispensável uma verdadeira coesão nacional. Quando o primeiro-ministro irlandês apresentou, aos irlandeses, as medidas anticrise, estava rodeado pelos líderes da oposição e pelas centrais sindicais e patronais. A coesão nacional é indissociável da coesão social, de sentimentos de pertença colectiva, de unidade e de solidariedade. Obriga a uma exemplaridade sem desvios, a uma trégua verdadeira em nome de interesses superiores, a uma mobilização geral de sentimentos e vontades. É uma cultura que infelizmente temos vindo a perder e que nem sequer passámos às gerações mais novas. A prática portuguesa tem sido a do salve-se quem puder: a divisão, o confronto, as falsas polémicas, os pequenos poderes, os interesses particulares, as fracturas sociais. Mudar esta cultura é muito mais difícil do que um encontro em São Bento. Há muito que ela impregna o nosso quotidiano, mas tornou-se agora mais visível e chocante: na insensibilidade dos gestores públicos que não querem renunciar às suas benesses, na prática reiterada de fraudes pelos beneficiários das prestações sociais ou na vontade egocêntrica do primeiro-ministro em prosseguir com o TGV ou o aeroporto.

"Nesta crise, só a coesão nacional e a social podem legitimar as medidas duras - tão duras quanto necessário - e eliminar as medidas iníquas. Aquelas que, em nome de um interesse nacional só sentido por alguns, penalizam não aqueles que aparentemente mais precisam, mas aqueles que exemplarmente mais merecem."


M. J. Nogueira Pinto,
DN, 6.5.2010

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