Seguro e a corrupção
Em matéria de corrupção, Seguro não quis ou não teve força política para se impor no PS. Deu um tiro no pé
A principal razão pela qual António José Seguro venceu Francisco Assis nas eleições internas do PS foi a sua reconhecida distância face ao universo Sócrates. Os portugueses tinham mostrado, nas legislativas de junho, que estavam fartos de um PS sem causas, de um primeiro-ministro que privilegiava a imagem em vez da substância e de uma governação pontuada de casos mal esclarecidos e de cumplicidades perigosas. Há sempre injustiças nestas avaliações, mas a verdade é que os militantes do PS confirmaram depois, expressivamente, a varridela daquela direção política. Muita má-língua e muito azedume por parte de quem tinha ficado com os pés de fora do regime escarneceu a imagem e o currículo de Seguro com a mesma leviandade com que escamoteou os pecadilhos académicos do líder "falecido" e se esqueceu que o requinte Armani era coisa de marketing.
Seguro devia compreender que não está seguro enquanto não arrumar com o passado de má memória. Com outra prática, outra gente, outras propostas. No Congresso, pactuou com a falta de autocrítica, um erro que pagará caro politicamente, pois permitiu uma recuperação mais rápida aos seus adversários internos. E eles perceberam tão bem as fragilidades do líder que foi vê-los desfilarem no púlpito, aviando discursos de quem tem a verdade na mão e sem o mínimo decoro face à sua condição de condenados pelo veredicto popular.
Mas se a liderança de Seguro se tem revelado mais ou menos hesitante nas questões internas, a verdade é que o secretário-geral do PS tem tido uma postura bastante positiva no seu relacionamento com o Governo. Saiu-se bem no mano a mano com Passos Coelho, tem conseguido marcar diferenças com a maioria governativa (apesar de estar prisioneiro do acordo com a troika), apresentou alternativas quando discordou de medidas, enfim, Seguro tem surpreendido ao demonstrar que estudou a lição. E sem recorrer a truques ou a golpes baixos como, infelizmente, tem sido prática na vida política portuguesa. É, por tudo isto, incompreensível a posição do líder socialista sobre a criminalização do enriquecimento ilícito. O PS foi o único partido que ficou de fora de um consenso sobre esta matéria, apresentando, no Parlamento, um projeto pífio, assente nos mesmos argumentos que serviram à anterior maioria para derrotar as sucessivas tentativas do "pai" desta legislação, justamente um socialista, João Cravinho. Ana Gomes, eurodeputada do PS e apoiante de Seguro, põe os pontos nos ii: "Continua a dar a sensação de que o PS não quer, de facto, combater a corrupção." E por mais que o líder se esforce por tentar explicar, ninguém entende. Ele conhece o sistema. Anda há demasiado tempo na vida política para saber o que se passa - as leis enviesadas, os esquemas corruptos, a dificuldade na obtenção de provas neste tipo de crimes... É preciso quebrar este ciclo infernal e há virtualidades nos projetos do BE, PCP e PSD/CDS que permitem encontrar uma fórmula capaz de tornar este país mais limpo e mais justo. António José Seguro não quis, ou não teve força política para se impor no seu partido. Deu um tiro no pé. De que se vai arrepender.
Áurea Sampaio
Quinta feira, 29 de Set de 2011
http://aeiou.visao.pt/seguro-e-a-corrupcao=f624758#ixzz1a0Ay0gB4
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